Sinodalidade e o fazer teológico à luz do processo sinodal

Synodality and theological practice in the light of the synodal process

DOI: https://doi.org/10.52451/rk3r0j97

Recebido em 28/05/2024

Aprovado em 13/09/2024

Alzirinha Rocha de Souza

Doutora em Teologia pela Université Catholique de Louvain – Bélgica, Mestre em Teologia pela Universidad San Dámaso – Madrid, Bacharel em Teologia pela PUC/SP. Estágio Pós-doutoral realizado na UNICAP – Recife. É membro da SITP – Sociedade Internacional de Teologia Prática, e líder do Grupo de Pesquisa José Comblin PUC/SP. É professora e pesquisadora da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) e do Instituto São Paulo de Estudos Superiores (ITESP). Email: alzirinharsouza@gmail.com. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-4512-8847

*Resumo: O leitor encontrará neste artigo, a pesquisa realizada para a Conferência realizada em 05 de setembro de 2023 no Itepa Faculdades. Nele, tratamos de apresentar no primeiro momento elementos de Sinodalidade na práxis, nas palavras e nos escritos que são inerentes, não somente ao momento atual de Igreja, mas à personalidade mesma do Papa, e em segundo momento à luz da primeira etapa universal do Sínodo realizada em outubro de 2023, apresentamos os temas de convergência e de desafios aí surgidos, e como, sobretudo, os desafios tocam intimamente ao trabalho teológico que deve colaborar para o seu avanço.

Palavras-chave: Sínodo; Papa Francisco; Práxis cristã; Eclesiologia; Evangelização.

Abstract: In this article, the reader will find the research conducted for the Conference held on September 5, 2023, at Itepa Colleges. Herein, we first present elements of Synodality in the praxis, words, and writings that are inherent not only to the current moment of the Church but also to the very personality of the Pope. In the second part, in light of the first universal stage of the Synod held in October 2023, we present the themes of convergence and challenges that emerged, and how these challenges, in particular, intimately affect the theological work that must contribute to their advancement.

Keywords: Synod; Pope Francis; Christian praxis; Ecclesiology; Evangelization.

INTRODUÇÃO

O texto que apresento, é referente ao encontro realizado em 05 de dezembro de 2023 – com os integrantes do Colegiado Superior da Itepa Faculdades, com o tema “Sinodalidade e o fazer teológico”, razão pela qual ele se apresenta em formato conferência e não estritamente artigo. Segue o texto:

Eu proponho a reflexão sobre o tema: Francisco e a Sinodalidade, a partir de dois momentos: 1) a análise da importância da Sinodalidade na vida e no papado de Francisco e 2) os elementos que surgiram na reunião do Sínodo para Sinodalidade, etapa universal, realizada em outubro de 2023.

1. A ANÁLISE DA IMPORTÂNCIA DA SINODALIDADE NA VIDA E NO PAPADO DE FRANCISCO

Para a primeira parte tomarei alguns pontos, que nos levam da análise do macro – não a partir de documentos, esses apenas formalizam o que é próprio da Teologia ... Antes, proponho dar um passo atrás, e pensar o tema a partir e desde as características da formação pessoal de Jorge Bergoglio, que nos ajudam a entender sua forma de condução da Sinodal da Igreja aos gestos concretos de Francisco que refletem sua forma pessoal de ser. E da segunda parte trataremos dos principais temas que foram tratados e que voltarão para as bases da Igreja para serem trabalhados até 2024.

Daí temos a primeira observação que podemos fazer sobre o Papa, que por vezes pode nos parecer sem importância, mas é essencial: o fato de tornar-se Papa não apagou os valores de Bergoglio, é dizer, o “poder fictício” que diz respeito ao cargo, não afetou seus valores pessoais, personalidade e crenças para a condução da Igreja, como veremos ao longo da nossa apresentação. A partir dessa afirmação poderíamos descrever uma gama de aspectos das expressões de Francisco que se integram e advêm de sua história, contudo como o tema nos pede vamos nos deter na forma “sinodal” pela qual conduziu sua vida e conduz hoje a Igreja. Para tanto eu divido minha exposição em três pontos.

1.1. FORMAÇÃO PESSOAL .

Um elemento essencial, é não esquecer que Francisco é um Jesuíta e mais ainda um Jesuíta Argentino! E como tal viu o Vaticano II sob essas duas óticas! Formado na Teologia do Povo, que segundo alguns autores foi a face argentina da TdLib que se baseia no Justicialismo e na Teologia da Cultura de seu mestre Juan L Scanonne, Francisco se constitui como alguém que tem/ou procura sempre ter um olhar global sobre as situações. Daí vem por exemplo a imagem do POLIEDRO – são muitas faces com particularidades únicas. Para o Papa, o mundo não é esférico, um bloco único, mas é poliédrico, formado por diferentes culturas/perspectivas que precisam ser entendidas em suas particularidades.

Desta formação, e contra os ISOLACIONISTAS/UNILATERALISTAS (aqueles que apelam às identidades nacionais) nascem as principais chaves de leitura para entender Francisco (sua prática e discursos que são intrinsicamente ligados): 1) Multilateralismo, 2) Cultura do Encontro, 3) Fóruns de Encontro, 4) Acordo/comprometimentos...

Entre eles, o que melhor o remarca e por isso nos lembramos sempre é: a Cultura do Encontro (EG 49). Estudioso de Romano Gardini, o Papa não abraça a Dialética Pura, é dizer, uma coisa versus outra, onde uma parte anula a outra, mas abraça o Contraste, onde uma parte sempre e de alguma forma se soma a outra.

Pelo contraste se estabelecem diálogos, as partes se transformam, e podem encontrar um ponto comum. Não por acaso, sua primeira Exortação Apostólica Evangelii Gaudium gira em torno a quatro eixos: 1) Tempo é superior ao Espaço, 2) Unidade sobre o conflito, 3) Realidade sobra a ideia e 4) Todo sobre a parte, que ao final nos levam ao tema central do ENCONTRO1.

[…] desenvolver uma comunhão nas diferenças, que pode ser facilitada só por pessoas magnânimas que têm a coragem de ultrapassar a superfície conflitual e consideram os outros na sua dignidade mais profunda. Por isso, é necessário postular um princípio que é indispensável para construir a amizade social: a unidade é superior ao conflito. A solidariedade, entendida no seu sentido mais profundo e desafiador torna-se, assim, um estilo de construção da história, um âmbito vital onde os conflitos, as tensões e os opostos podem alcançar uma unidade multifacetada que gera nova vida. Não é apostar no sincretismo ou na absorção de um no outro, mas na resolução num plano superior que conserva em si as preciosas potencialidades das polaridades em contraste (EG 228).

Desde Argentina, demonstrou “um realismo no trato das coisas e um trato pessoal” (Romaris, 2020). Após ter sido Superior da Cia de Jesus (1973) naquele país, e entrado em atrito com o então Gov. Militar que refletiu na crise com padres e militares, em 1992 foi “resgatado” pelo Cardeal Quarracino e é feito Bispo Auxiliar de Buenos Aires, exercício marcado por práticas pouco comuns aos Bispos: proximidade com o Povo, atendimento nas favelas de Buenos Aires, vida extremamente simples, eu diria ‘normal”. Então como Cardeal, participa de três momentos eclesiais chave: 1) Sínodo de 2001 – quando se tornou conhecido para mundo, ao assumir a relatoria do Sínodo. 2) Conclave de 2005: colhe os frutos de 2001. É o segundo mais votado com 40 votos no 3º escrutínio. Volta para Argentina e é eleito Presidente da Conferência Episcopal Argentina 3) 2007 – Conferência do Celam em Aparecida – é relator.

1.2. O QUE FRANCISCO NÃO DESEJA DESDE O COMEÇO?

O que o Papa deseja e defende é o que provoca o conflito com seus “opositores”, é dizer o Integralismo. Francisco NÃO quer em absoluto uma Igreja INTEGRALISTA, entendendo Integralismo como: poder unilateral, soberanismo, aquela ideia de que ninguém pode destoar do TODO.

Como pensar de forma, não unilateral, integralista para resolver as principais crises encontradas pelo Papa... e ele começa mapeando as crises da Igreja:

1) Concorrência e encolhimento da Igreja – Islã cresceu 35% entre 2010-2030, é dizer que em 2030 26% da população pertencerá à religião islâmica. Daí a importância do Diálogo Inter-religioso e do Diálogo Ecumênico, e que não são para as pessoas mudarem de lado, mas para construirmos juntos um outro mundo.

2) Crise da Secularização: Em parte alimentada por essa guerra entre integralistas e não integralistas, que refletem os diferentes componentes da questão de fundo que é a LIBERDADE RELIGIOSA, que culmina em três vertentes: 1) Tradicionalistas: que pedem o isolamento da Igreja da sociedade e suas questões, 2) Políticos: que desejam manter a relação Ig x Estado e, 3) a Santa Sé que mantém a separação Igreja x Estado e a liberdade de cada um.

3) Crise do Pentecostalismo: 40% dos Católicos do Mundo – AL e 38% são pentecostais aliados ao Trad Católico Norte=americano. Segundo Spadaro, há um reconstrucionismo Pentecostalista USA, para ganhar as estruturas de poder, é dizer se organizam politicamente para defender que a Palavra seja absorvida pelas estruturas legais. É isso que chega a AL, em especial no Brasil.

4) Crises Internas/Questões morais. A autoridade da Igreja vem da Força Moral construída ao longo dos Séculos. Uma autoridade moral que vem do poder espiritual. Leão 13 e seus três pilares: paz, perseguidos e liberdades humanas, seus sucessores, Concílio de Latrão (a legitimidade espiritual e o arbítrio) remarcam a Santa Sé como Estado e com a que arbitra as questões. Ora, as questões morais, atacam frontalmente a autoridade moral da Igreja, desde antes e determinantes para a renúncia de Bento XVI – Pedofilia (desde 2002 denunciado pelo The Boston Globe nos USA), VatiLeaks, Banco do Vaticano, desvios vários.

E o seu discurso nas Congregações Gerais (as reuniões que antecedem o Conclave que tratavam dos temas acima de crise, foi decisivo para sua eleição. Era o 16º dia das Congregações Gerais 09/03/2013, em uma fala curta, sem nada anotado no papel onde ele destaca: 1) que a razão ser da Igreja é o Evangelho, 2) a Igreja é chamada a sair dela mesma para ir em direção às periferias geográficas e existenciais, lá onde reside o mistério do pecado, a dor, a injustiça, a ignorância, lá onde o religioso , o pensamento são retomados, lá onde estão todas as misérias, 3) do perigo de uma Igreja autorreferencial, de uma Igreja que vive dobrada sobre si mesma e para ela mesma. E concluiu: “Essa análise deveria contribuir com um esclarecimento sobre as mudanças e as reformas possíveis que devem ser feitas para a salvação das almas” (Chiron, 2020, p. 35-37). Em resumo, sua fala girou em torno a 4 chaves de leitura: humildade, moralidade, periferia e maior participação. E segundo o Cardeal Britânico Murphy O’Cornnor: “Quando ele terminou, um silêncio se instalou” e declarou o Cardeal austríaco Schonborn: “E eis aqui o que então nós temos necessidades”, entre outros que reagiram positivamente a sua fala. Foram 2,5 minutos que mudaram a vida da Igreja.

1.3. DEMONSTRAÇÃO DE SINODALIDADE

Eleito em 2013, Francisco inicia seus trabalhos pelas reformas em três dimensões:

1) Cultural – gestos simbólicos, culturais midiáticos que traduzem as suas reais intenções. Ana Maria Chimello, chega a dizer da “encíclica dos gestos” é dizer mesmo que o Papa não dissesse uma palavra ou não escrevesse nada, só de ver seu testemunho cada um de nós entenderia o que ele quer. Lembremos que sua primeira viagem internacional, é dizer quando ele saiu do Estado do Vaticano, foi para ir a Lampeduza, ver de perto a questão migratória.

2) Administrativa: a reforma da Cúria, que começou pela formação do G9 (grupo de cardeais como colaboradores para a realização das reformas) e finalmente

3) a dimensão Pragmática: participação nos fóruns mundiais, EG, a Laudato Si, construída em conjunto com cientistas e teólogos. Seus gestos simbólicos reforçam a Administrativa e a Pragmática e estão todas refletidas em EG, que desde meu ponto de vista é o Programa de Governo de Francisco, e que deveria ser relida continuamente nas nossas comunidades.

Forma de trabalho do Papa é multilateralista, é dizer a Santa Sé se coloca como dialogante, como mediadora de conflitos. Recupera-se então o Diálogo interno e externo, baseado na força do carisma do Papa, desvelado por exemplo nos formatos das realizações de reuniões comuns, onde os temas são discutidos com liberdade por especialistas e por último a Santa Sé apresenta sua visão, mobilizam-se setores diferentes para fazer acompanhamento dos temas, e se realizam pactos em diferentes níveis que criam um sistema de avanço da Agenda Multilateral. Da mesma forma as viagens Apostólicas são pensadas por temas que possibilitam o diálogo externo. O Papa quer caminhar junto não somente em Igreja, mas com o mundo em suas realidades e demandas. De 34 viagens (incluindo essa última da Hungria e Eslováquia onde se tratou do tema do acolhimento aos refugiados), em 52 países, desde uma zona de guerra em Bangui na Rep Centro Africana, passando pela Suécia 2016, 500 anos da reforma, a Abu Dabi nos Emirados Árabes onde se assina como Grande Imã a Declaração de Abu Dabi que é o pano de fundo da Fratelli Tutti, a última, 2021 ao Iraque e a terra de Abrão, sob o lema “Sois todos irmãos” (Mt 23,8).

O fato, é que essa forma dialogada, multilateralista, portanto SINODAL, se reflete na Política interna, na condução da Igreja, SEMPRE centralizado no tema da DIGNIDADE HUMANA E DIREITO À VIDA, ou melhor o Direito à vida é integrado à Dignidade Humana. Uma é interligada a outra e ambas são de igual importância. Francisco traz os temas à pauta: pena de morte, eutanásia, direito à vida, tudo isso é maior que a morte. Francisco amplia a lógica de análise e horizonte dos temas: sobre o tema do aborto, vai afirmar que a DEFESA À VIDA é maior que esse tema. Dessa forma, impede o diálogo polarizado (Romaris, 2020).

Os gestos sinodais de Francisco nem sempre são grandes, mas seguramente significativos e ampliam o significado mesmo do termo sinodal. A escolha de viver na Casa Santa Martha, onde ocupa a suíte 201 (Chiron, 2020, p. 56), é explicada por ele mesmo (Papa Francisco, 2013): “Eu não poderia viver só no Palácio (...) Eu tenho necessidade das pessoas, de encontrar as pessoas, de falar com as pessoas... Cada um deve seguir adiante com sua maneira de viver e de ser”. A escolha da residência Santa Martha um dos primeiros sinais da “conversão do papado” que Francisco mesmo evocará em EG, 32, entre tantas conversões necessárias na Igreja.

Contudo, entre tantas falas do Papa, creio que duas são essenciais para compreender o que o Papa entende como “espírito sinodal”. O primeiro é o emblemático discurso da Cúria Romana, por ocasião das festividades do Natal de 22 de dezembro 2014 (Papa Francisco, 2021). E o segundo, é outro emblemático discurso que faz para a mesma assembleia em 21 de dezembro de 2015, é dizer após um ano, onde trata das virtudes necessárias. Nestes, mesmo que não trate diretamente do tema da Sinodalidade e que tenha sido dirigido à Cúria Romana, indica as “doenças e virtudes” que atingem a todos/as cristãos e que são, de forma direta, a origem da ruptura ou podem nos encaminhar ao espírito sinodal, dialogal, multilateralista.

2. ELEMENTOS DE CONVERGÊNCIA/DIVERGÊNCIA E DESAFIOS, QUE SURGIRAM NA REUNIÃO DO SÍNODO PARA SINODALIDADE, ETAPA UNIVERSAL, REALIZADA EM OUTUBRO DE 2023

Apresentamos a leitura dos temas que surgiram na etapa universal do Sínodo para sinodalidade em outubro último a partir de três perspectivas: pontos de convergência, pontos de divergência e desafios emergentes.

2.1. PONTOS DE CONVERGÊNCIA COM O CONCÍLIO VATICANO II:

  1. Maior inclusão do Laicato: em especial as Mulheres. Considerar a diversidade entre Clero e Leigos, lembrando que TODA A IGREJA É MINISTERIAL, por isso se voltou fortemente ao tema do batismo (e não da ordem) como base para POVO DE DEUS. A fonte de todos os ministérios é o batismo.
  2. Opção preferencial pelos pobres: Retoma Medellín e Puebla. Papa – pobres não como objetos de caridade, mas como SUJEITOS. Bispo de Marrocos por ocasião da reunião, chegou a propor para a próxima etapa do Sínodo um novo pacto das Catacumbas.
  3. Necessidade de voltar às pequenas Comunidades Eclesiais: Deixar as comunidades que favoreceram o Pentecostalismo Católico dos anos 70 a 90 e voltar à formulação de pequenas comunidades que retomam o sentimento de comprometimento e pertença do Povo de Deus à Igreja.
  4. A urgente necessidade de uma mudança na formação dos seminários: que hoje são clericalistas e de “sacerdotalização” – isto é, em chave PRÉ CONCILIAR. Hoje os que estão na formação se afirmam SACERDOTES – sacerdócio cultural e de poder: raiz do CLERICALISMO que afasta a condição de SERVIÇO e TESTEMUNHO. Esquecem-se que todo o povo é régio, profético que tem alguém que preside uma ASSEMBLEIA SACERDOTAL TODA ELA.
  5. Igreja acolhedora de “todos, todos, todos” incondicionalmente: evoluir na busca da compreensão teológica da não exclusão de ninguém; do acesso à Eucaristia e aos sacramentos, compreendendo que sacramento não é merecimento! (Lgbtquia+, casais II união, Cap. 8 Sínodo da Família).
  6. Abusos na Igreja: necessidade de a hierarquia estar submetida a algum mecanismo de controle de seu poder, que gere transparência (prestação de contas) e mecanismos de controle de um poder que se dá por suposto, ser infinito e ilimitado. Isso é muito próprio da sacerdotalização. Alguém que se reveste do sagrado e que se coloca acima do bem e do mal, causando diversos tipos de abusos: Consciência, Econômico, Poder, sexuais – que têm raiz no clericalismo.
  7. Necessidade da superação da xenofobia, racismo, misoginia, apartheid sexual (Institucionais): Inclusive contra as Igrejas do Oriente e da África (são discriminadas). Necessidade do fim de posturas colonizadoras.
  8. Necessidade de continuar a reforma da Cúria e do primado papal: a maioria do Povo de Deus, não percebe as reformas realizadas até o momento. Se percebe, no entanto, que o Papa sofre oposição dentro de casa.
  9. Reforma do Papado: Passa pela Comissão Doutrina da Fé que agora é ligada diretamente ao Papa junto com a Dicastério para Evangelização. Atual presidente Victor Manual Fernandez – Argentino. Comunhão entre as Igrejas e colegialidade eclesial. A época de João Paulo II – 236 Teólogos processados pela CDF – hoje nenhum. Hoje referências objetivas na avaliação do pensamento e não de subjetividade.
  10. Cultura de formação para o povo de Deus em seu conjunto: Clero, religiosos/as, leigos/as, etc. UM SABER COMUM QUE FORMA PARA A COMUM-UNIDADE.
  11. CDC – Código de Direito Canônico: Precisa ser revisto urgentemente. Igreja sinodal exige uma reforma do Código. Hoje se trabalha por Moto Próprio que muda para uma Igreja sinodal.

3. PONTOS DE DIVERGÊNCIA/DISTANCIAMENTO DO CONCÍLIO VATICANO II

  1. Concepção de Sinodalidade: O QUE SE ENTENDE POR SINODALIDADE: ainda há divergência sobre o conceito de Sinodalidade. Sinodalidade NÃO É UM MODO DE PROCEDER, mas um MODO DE SER. Para alguns não é da natureza da Igreja – a Igreja é hierárquica e não sinodal é a que está SOBRE o Povo de Deus e não dentro do Povo de Deus. Cardeal Muller – quer voltar a comunhão = vertical, ao passo que Vaticano II é horizontal com os batizados e a humanidade. Isso é uma teologia Docetista sem a Pneumatologia – fechada em um Cristomonismo que gera Igreja comunhão e NÃO SINODAL.
  2. Eclesiologia Povo de Deus– Bíblica – e por isso é em linha com a Tradição e onde se situam os diferentes espações eclesiais inclusive a hierarquia. Não há caráter sociológico nisso.
  3. Conceito de Tradição: Conservadores concebem a tradição de forma FIXISTA – o que não houve não pode haver, o que tem não pode mudar. Ao contrário Bruno Forte afirma que “Tradição é a História do ES na História do Povo de Deus”. Tradição é necessariamente aberta e dinâmica! Uma tradição que não se renova, morre!
  4. Risco de confundir Doutrina e Norma/disciplina: Doutrina e fé – não se alteram, são questões de fé. Normas e disciplina – não são questões de fé – mudam (celibato, diaconato das mulheres, etc.).
  5. Ordenação de homens casados: alta oposição na reunião Sinodal. Devemos lembrar que o Documento de Santarém 1972 – retomou a questão da colaboração daqueles que deixaram o ministério e tratava como Escândalo o fato de privar as comunidades da Eucaristia, e exatamente de ter padres casados, coisa que aliás existe nas Igrejas do Oriente ligadas a Roma.
  6. Ordenação de mulheres: Maior oposição ainda sobretudo da Europa, Asia e África. É preciso compreender que não se trata de uma teologia de gênero. É uma questão cultural pela qual se tenta justificar teologicamente. Há a necessidade de uma mudança de pensamento sobretudo das mulheres (mulheres europeias se colocaram em contra durante o Sínodo)
  7. Questões de poder: Querida Amazônia e Predicare Evangelium – reafirmam que o PODER VEM DO BATISMO – não os ministros ordenados que têm o poder, aliás ninguém tem poder, o que existe na Igreja são SERVIÇOS distintos.
  8. Participação do Povo de Deus na escolha de Padres e Bispos: como era na origem da Igreja.

4. DESAFIOS EMERGENTES

  1. Produção teológica para superar os “Pontos sensíveis” – avançar o papel de teólogos /as para ajudar o Sínodo a avançar. Comblin vai dizer que existem dois momentos nos quais a Hierarquia e Teólogos convergiram – Medellín e Vaticano II. Hoje não mais Bispos teólogos, eles são funcionários administrativos e pastores talvez.
  2. Formação de conjunto: comunidade como sujeito eclesial. COMUNIDADE e não mais IGREJAS DE MASSA. Que isso não seja optativo, mas obrigatório (CDC) decretado a obrigatoriedade de Conselhos e Assembleias Pastorais.
  3. Temas morais: De temas que deixem de ser MORAIS e passem a SER HUMANOS. LgtbquiA+. PASTORAL - que deixe der ser massas, de santuários, de cercos de Jericó e cheguem à concretude das pessoas. Voltar às comunidades de caráter doméstico – a Igreja durante séculos não teve templos! Hoje ao invés e aumentar a comunidade, aumentam-se os templos. É necessário voltar à origem do que origina (Duquoc), sobretudo na questão de Eleição de Bispos que hoje passa por meia dúzia de consultas mais vinculadas (a) à política eclesiástica, e ao tema das Mulheres, notadamente da necessidade de o Papa sair da argumentação de Balthazar 1985 – Jesus como esposo e Igreja como Feminino. Ideia de Igreja e de mulher idealizada, inexistente, sem sentido com as mulheres que são e estão na base da Igreja de HOJE. A mulher se reduz a uma maternidade idealizada? Quando essa não é a real situação da maioria das mulheres que constituem a base da Igreja.

Enfim, o Padre Libanio, dizia que “se tudo é continuidade não há mudança. É necessário não um movimento de ruptura, mas de continuidade e descontinuidade! É necessário criar espaços de reflexão para o avanço do pensamento teológico, que possa subsidiar elementos seguros para o avanço da Igreja. Eis o desafio!

CONCLUSÃO

Início minha conclusão afirmando que tratar do tema da Sinodalidade e afirmar-se sinodal não é simplesmente cumprir uma tarefa a mais na Igreja. E creio que o Papa revela isso. Não é escolha deliberada (eu quero ou não ser sinodal), antes, é parte constituinte do ser cristão que compõe a Igreja, em última instância é A FORMA DE SER IGREJA. E porque é “A” FORMA?

“Ser” Sinodal, não é uma novidade e nem porque o Papa Francisco o é! Ser sinodal é entender e incorporar o Espírito de Jesus, da forma de condução de seu grupo, da forma inclusiva de como estabelecia vínculo e dava voz às pessoas. Ser Sinodal é voltar às fontes (e não aos fundamentalismos) das primeiras comunidades descritas em Atos, e perceber a dinâmica estabelecida a partir dos ensinamentos do Mestre. Não quer dizer afirmar a perfeição nas relações, naturalmente, mas superar as imperfeições advindas das limitações humanas, à medida que a Igreja impulsionada e aberta à ação do Espírito Santo, se conforma, isto é, se põe em conformidade com a prática de Jesus. Coloquemo-nos todos, pois, no esforço para esse caminho, pautado sobretudo pelas virtudes necessárias, que nos ajudaram afastar-nos de nossas doenças.

Referências

Brighenti, Agenor; Luciani, Rafael. Instrumentum Laboris para a segunda sessão da Assembleia do Sínodo. Resumo do texto e elementos de análise. Cadernos de estudos Observatório Latino-Americano da Sinodalidade OLS. n.003/2024. Disponível em: https://observatoriosinodalidad.org/pt-br/project/instrumentum-laboris-para-a-segunda-sessao-da-assembleia-do-sinodo-resumo-do-texto-e-elementos-de-analise/. Acesso em: 10 de janeiro de 2024.

Chiron, Yves. François Phobie. Paris, Cerf, 2020.

Francisco. Atividade do Santo Padre Francisco. Conferência de Imprensa quando de seu voo de volta da viagem apostólica ao Brasil em 28 de julho de 2013. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/events/event.dir.html/content/vaticanevents/pt/2013/7/28/papa-francesco_20130728_gmg-conferenza-stampa.html. Acesso em 15 de agosto de 2024.

Francisco. A Cúria Romana e o Corpo de Cristo. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/169-noticias/noticias-2015/538719-discurso-do-papa-francisco-aos-cardeais-e-colaboradores-da-curia-romana. Acesso em 10 de setembro de 2021.

FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium. Brasília: Edições CNBB, 2013.

Romaris, Marisol. Encontro com o Observatório Eclesial Brasil em Set 2020, via remoto. Não publicado, ٢٠٢٠.

Sínodo para Sinodalidade. Instrumento Laboris para sessão de 2024: Sínodo para Sinodalidade. Disponível em: https://www.synod.va/content/dam/synod/assembly2024/il/pdf/POR---Instrumentum-laboris-2.pdf. Acesso em 03 de janeiro 2024.

Sues, Paulo. Comunidade de comunidades: Evangelização e cultura do encontro. Impulsos para uma Agenda Pastoral. In: Revista Vida Pastoral, Publicado em edição especial – 1º centenário dos paulinos - ano 55 - número 300. Disponível em: https://www.vidapastoral.com.br/artigos/pastoral-e-comunicacao/comunidade-de-comunidades-evangelizacao-e-cultura-do-encontro-impulsos-para-uma-agenda-pastoral/. Acesso em 10 de setembro de 2023.


1 Sobre os pontos da Cultura de Encontro expressos em EG, pode-se aprofundar no texto: SUES, Paulo. Comunidade de comunidades: Evangelização e cultura do encontro. Impulsos para uma Agenda Pastoral. In: Revista Vida Pastoral, Publicado em edição especial – 1º centenário dos paulinos - ano 55 - número 300. Disponível em: https://www.vidapastoral.com.br/artigos/pastoral-e-comunicacao/comunidade-de-comunidades-evangelizacao-e-cultura-do-encontro-impulsos-para-uma-agenda-pastoral/. Acesso em 10 de setembro de 2023.